Temer recomenda 'A Casa de Papel' em entrevista de vídeo. Impopular, presidente mira jovens

Publicado em 16/05/2018 as 11:15

Depois da repercussão negativa sobre slogan para marcar dois anos de governo, o presidente Michel Temer (MDB) veiculou nesta terça-feira (15), nas redes sociais do Planalto, vídeos em que concede “entrevista exclusiva” dentro de seu gabinete presidencial. Diante de uma mulher sorridente com sua filmadora portátil e um cinegrafista que acompanha a cena, um Temer menos sisudo fala rapidamente sobre amenidades e dá pinceladas sobre sua gestão, mas nem uma palavra profere sobre o caráter inédito de seu governo: a primeira vez que um presidente da República é denunciado por atos cometidos no exercício do mandato. Além de duas denúncias, ambas barradas pela Câmara, o emedebista é alvo de dois inquéritos ativos na Procuradoria-Geral da República (PGR).

Mas é dia de celebração. Na antessala do gabinete, a entrevistadora se dirige ao “ajudante de ordens”, que se apresenta como tenente-coronel Furlan, e diz ter hora marcada com o presidente. Ao encontrar Temer já dentro do gabinete, a moça exclama: “Ai, gente, que legal! Tudo bom, senhor presidente? Muito prazer, eu sou a Nina, do canal governo no Twitter, e a gente veio aqui trocar uma palavrinha com o senhor. Podemos?”. Temer podia, e passou a falar com Nina.

Trata-se de Nina França, repórter de mídias digitais contratada pelo governo. Despachada, Nina é responsável pela publicação de diversos vídeos na conta oficial “Governo do Brasil” (@governodobrasil) no Twitter. Nada de corrupção ou temas negativos, frise-se.

Nos vídeos abaixo, intitulados “Drops do Planalto”, o emedebista fala descontraidamente com a interlocutora, que apresenta questões como “o que o senhor tem a dizer aos jovens brasileiros?”; “conta pra gente: como é ser o presidente da República?”. Temer fala até sobre seus hobbies.

“Leio muito, mas vejo muitas séries. Você sabe que, recentemente, eu vi uma série sobre o [presidente dos Estados Unidos, Donald] Trump, muito interessante, com quatro capítulos? Assim como aquele [produção espanhola] A Casa de Papel. Então é uma coisa muito…”, diz Temer, ao que a entrevistadora interpela. “Ah, tá famosa, essa, num tá?” Temer prossegue: “Famosa. Essa é famosa, eu via. E outras tantas séries que eu vi ao longo do tempo, né?…”

Mais cedo, também por meio do Twitter, a equipe do presidente escreveu: “Lançamos o plano Brasil Mais Turismo para que esse setor possa gerar empregos. Pelo @avancarpar, R$ 680 milhões serão usados em obras de melhoria turística e a construção de parques temáticos. Tudo para alavancar o turismo. #Avançamos“.

Realidade

Como este site lembrou no último sábado (12), quando a gestão Temer completou dois anos, continuam nas alturas os índices de rejeição ao governo. Por outro lado, nunca são superiores a 5%, em diversas pesquisas de opinião, o percentual dos que dizem aprovar a gestão emedebista. Temer sabe que jamais teve vida fácil desde aquele maio de 2016, quando o Senado afastou Dilma Rousseff (PT) em um controverso e turbulento processo de impeachment. De lá para cá, o professor de Direito Constitucional acumulou denúncias de corrupção, patrocina medidas impopulares e protagonizou cenas de crise institucional que quase o derrubaram da cadeira principal do Planalto.

Hoje cheio de cicatrizes e alvo da Operação Lava Jato, Temer conseguiu barrar duas denúncias da Procuradoria-Geral da República (PGR) com a ajuda da Câmara, sob acusação de comprar o voto de deputados por meio de emendas parlamentares e distribuição de cargos, projetos, medidas e demais benesses. Acusado de corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, o presidente ainda enfrenta outros dois inquéritos por suspeita de participação em malfeitos.

Em um deles, Temer é acusado de receber propina para favorecer a empresa Rodrimar S/A, concessionário do Porto de Santos, ao editar o Decreto dos Portos (Decreto 9.048/2017) em maio do ano passado. No inquérito, o presidente volta a ser apontado como suspeito de cometer os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Embora a Rodrimar atue no Porto de Santos, base de diversas operações do setor petrolífero, o caso não guarda relação com a Lava Jato.

O outro inquérito ativo contra Temer é referente ao que o MPF definiu como “quadrilhão do PMDB”. A investigação apura pagamento de propinas da Odebrecht, uma das empreiteiras-pivô da Lava Jato, aos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Minas e Enegia) – a propina, segundo as investigações, seriam contrapartida pelo tratamento especial dispensado à empresa na Secretaria de Aviação Civil, que foi comandada pelos dois ministros entre 2013 e 2015. Em 2 de março, a pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o ministro Edson Fachin, relator do petrolão no Supremo Tribunal Federal (STF), incluiu o presidente entre os beneficiários do esquema de corrupção.